Este carnaval silencioso, melancólico, contaminado, triste, sem Moraes,
sem Ademar e nossa furta-cor, sem os trios, sem as fuleragens, sem as
muquiranas, sem os blocos afro e de índios, sem a mudança do Garcia (voz da
cidade toda!), nos apresenta algumas necessárias reflexões…. Trago, neste
pequeno texto e provocação, apenas uma questão (sem a menor originalidade, mas
que fingimos (alguns) não ouvir/sentir, há séculos!): o que estamos fazendo com
as nossas vidas? Em outras palavras, quanto desencantamento cabe numa
existência, e até quando suportaremos tanta violência? Para tanto, peço ajuda
aos indispensáveis artistas da nossa música popular, Moraes Moreira e Fausto
Nilo, que já registravam na canção frevo-carnavalesca Bloco do Prazer, lá pela
década de 1980, que “(…) a vida tá pouca e eu quero muito mais…”.
Sim, precisamos de paixão e de utopia, de carne e de carnaval, mas,
senhores poderosos deste lugar, também queremos e precisamos de vacina, de
respeito a todxs, de um projeto de nação acima das corporações
político-partidárias, de emancipação, de soberania no jogo geopolítico mundial,
de um estado laico, de menos concentração de renda e oportunidades, de equidade
antes do discurso de meritocracia… Ainda que presente e cada vez mais real,
vamos combinar que “tá chatona” esta visão distorcida e míope de convivência
utilitária, do capital hegemônico, especulativo, explorador e desestabilizador
de países e democracias. No português das quebradas, é preciso pegar a visão de
que é tiro no pé, deselegante e fora de moda já em países nórdicos e no Canadá
também, por que não dizer… Pega visão de uma vez, “pra libertar seu coração”…!
A antiguidade destes temas aqui expostos (exploração, desigualdade e
desencantamento dos sujeitos) é um sinal explícito de que algo não vai bem há
muitos carnavais… Mas o que fazer? Fugir para a Chapada Diamantina ajuda, mas
não vai resolver… Postagens em redes e armadilhas sociais ajudam, mas não são o
suficiente… Pergunte a você mesmo o que “(…) da vida arrasa e contamina o gás
que embala o balancê”? Aliás, qual é o seu balancê, bebê? Ou só vai de BBB? Vá
ali e volte já, tudo bem… Vamos continuar juntos, porque esta bagaça é nossa e
precisa melhorar! Vamos, “feito loucos”, porque fomos de razão até agora, e
está tudo muito estranho, não é verdade?!
Então, vamos “(…) meu amor, feito louca, que a vida tá pouca…” e… meus
dois amigos psicólogos sumiram, de tanto trabalho… Amanhã, não aparecerão
porque sentiram o baque virado da contemporaneidade excludente… que triste…
Voltem! A marcha dos desumildes não está lenta, dista de equilíbrio, e a gente
quer e merece muito mais, também, se liguem! A dor deixou de arrebentar e
passou a estraçalhar, então, fique peixe, se plante, cuide de sua rua, bairro,
canteiro, quintal, coração… Faça isto com alma, e vamos reduzir,
consideravelmente, a quantidade de farmácias nas esquinas e calçadas sem
árvores…
Qual é o balancê? O balancê é o da leveza, da altivez e da
integridade. Da certeza que precisamos ecoar e reverberar mais as insatisfações
e, também de atitudes diárias, incessantes, que prezam e evocam um
futuro/presente melhor, de cores vivas, e alto, mas muito alto astral, porque
eles passarão e veremos, de mãos dadas, que vale a pena sonhar e alimentar
utopias, mas sempre com on no modo atitude. Atitude, aliás,
também parece ser a questão. Como num looping, evitando
esquecimentos, eis que voltamos às provocações iniciais: o que estamos fazendo
com as nossas vidas, e até quando suportaremos tanta violência? Vamos passar
para a próxima postagem mesmo, sem, contudo, termos virado a página de nossa
trágica história?
Este carnaval não deu, e foi melhor assim, sabemos. Então, se chegue, e
cole na corda do já anunciado Bloco do Prazer, que também é da reivindicação de
uma melhor condição humana para todxs, independente de qualquer categoria,
binômio, logradouro, mistério, ministério, continente, bob de cabelo etc. Mas
já nos considero na concentração de outro mais importante, sabe por quê? Por
que esperança é a “fina flor do meu jardim”!
Abração,
Armando Castro é Professor da área de Música e Cultura do CECULT/UFRB
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